Não faz muito tempo que para assinar um contrato, quando os contratantes não estavam no mesmo local, deveriam (1) imprimir o documento; (2) assinar; (3) ir ao cartório para autenticar sua assinatura (isso se já tivesse “firma aberta”); (4) enviar via correio para o outro contratante, que deveria fazer o mesmo processo e, ao final, remeter, ainda, uma via com todas as assinaturas, também via correio. A finalização desse processo levava dias para se concretizar.
As assinaturas eletrônicas/digitais por meio de certificados digitais (“tokens”) e plataformas digitais, permitiu que todo esse procedimento seja realizado em minutos de qualquer lugar do mundo, até mesmo pelo celular.
No entanto, há muito se discute na jurisprudência brasileira acerca da validade das assinaturas eletrônicas por meio de plataformas digitais (tais como: “Clicksign”; “Docusign”, etc), em razão das assinaturas eventualmente não serem realizadas por certificadora credenciada pela ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira).
A título de exemplo, em 05/06/2023 (há pouco mais de um ano), a 19ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade, decidiu ser inválido um contrato com assinatura eletrônica através de plataforma digital que NÃO está cadastrada perante a ICP-Brasil, conforme segue:
APELAÇÃO CÍVEL. BUSCA E APREENSÃO. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. CONTRATO COM ASSINATURA ELETRÔNICA ATRAVÉS DE PLATAFORMA DIGITAL IGREE QUE NÃO ESTÁ CADASTRADA PERANTE A INFRAESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS BRASILEIRA – ICP-BRASIL. IMPOSSIBILIDADE DE CONFERÊNCIA DA AUTENTICIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1– Nos termos do artigo 1º, § 2º, inciso III, da Lei Federal n.º 11.419/2006, a autenticidade de assinatura eletrônica demanda a identificação inequívoca do signatário, o que se dá mediante a utilização de certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada (ICP-Brasil). 2- Portanto, somente é admitida a assinatura eletrônica de contratos quando seja possível conferir a autenticidade por plataforma digital cadastrada perante à ICP-Brasil. 3– Recurso conhecido e não provido. (TJ-PR 00158510220228160030 Foz do Iguaçu, Relator: jose americo penteado de carvalho, Data de Julgamento: 05/06/2023, 19ª Câmara Cível, Data de Publicação: 05/06/2023)
Contudo, nos parece que esse entendimento está na contramão dos anseios da sociedade que, pela facilidade, agilidade e funcionalidade das plataformas de assinatura digital, consolidaram sua essencialidade para a assinatura de contratos e outros instrumentos jurídicos, enfim, para todas as transações comerciais privadas.
Foi exatamente neste sentido que a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, de forma unânime, no julgamento do RECURSO ESPECIAL nº 2.159.442 PR, ocorrido em 24/09/2024, reconheceu a validade da assinatura eletrônica, por meio de plataformas digitais, independente do credenciamento ICP-Brasil.
Afirmou a Relatora, Ministra Nancy Andrighi, que “[…] Assim, negar validade jurídica a um título de crédito, emitido e assinado de forma eletrônica, simplesmente pelo fato de a autenticação da assinatura e da integridade documental ter sido feita por uma entidade sem credenciamento no sistema ICP-Brasil seria o mesmo que negar validade jurídica a um cheque emitido pelo portador e cuja firma não foi reconhecida em cartório por autenticidade, evidenciando um excessivo formalismo diante da nova realidade do mundo virtual.” (grifo nosso).
Este entendimento recentemente externado pelo Superior Tribunal de Justiça, a nosso sentir, prestigia a agilidade, a praticidade e, porque não dizer o avanço da tecnologia em prol das relações jurídico-comerciais, que não mais podem ser engessadas por formalismos injustificados.
Escrito por:
André Luis Quatrini Junior
Advogado – Integrante do Setor Cível