
Ao julgar o ARE nº 843989 (Tema 1.199), em agosto/2022, o Supremo Tribunal Federal (STF) havia fixado as seguintes teses de repercussão geral:
1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA – a presença do elemento subjetivo – DOLO;
2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 – revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa – , é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes;
3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente;
4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.
Seguindo essas premissas, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou que as regras da nova Lei de Improbidade Administrativa (LIA) para bloqueio de bens também devem ser aplicadas aos casos anteriores à sua vigência que ainda estejam em tramitação.
Pela redação original da LIA, a decretação da indisponibilidade de bens podia ser decretada liminarmente com base apenas em indícios de responsabilidade, pois o perigo da demora era presumido em favor da coletividade.
Com a nova redação conferida pela Lei nº 14.230/21 ao artigo 16 da LIA, para o deferimento da medida tornou-se necessário demonstrar o perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo, desde que o juiz se convença da probabilidade da ocorrência do ato ímprobo, após a oitiva do réu em 5 dias.
Salvo se essa oitiva prévia, comprovadamente, puder frustrar a efetividade da medica ou houver circunstâncias que recomendem a proteção liminar, não podendo a urgência ser presumida.
Sendo que o valor da indisponibilidade considerará a estimativa de dano indicada na petição inicial, permitida a sua substituição por caução idônea, por fiança bancária ou por seguro-garantia judicial, a requerimento do réu, bem como a sua readequação durante a instrução do processo.
Nesse sentido, valendo-se de dispositivos do Código de Processo Civil que preconizam que a tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada (art. 296), que o juiz deve considerar fatos constitutivos, modificativos ou extintivos surgidos no curso do processo que possam influir no julgamento de mérito (art. 493) e que se o relator constatar a ocorrência de fato superveniente à decisão recorrida, ele deve ser considerado no julgamento do recurso, após intimação das partes (art. 933), o STJ confirmou que as novas regras da LIA para o bloqueio de bens também se aplicam às ações de improbidade administrativa em curso, aprovando a seguinte tese:
“As disposições da Lei 14.230/2021 são aplicáveis aos processos em curso para regular procedimento da tutela provisória de indisponibilidade de bens, de modo que as medidas já deferidas poderão ser reapreciadas para fins de adequação à atual regra da Lei 8.429/92.”
Isso significa que os réus em ações de improbidade administrativa em andamento com bens bloqueados podem pedir a reavaliação dessa indisponibilidade, mesmo que a demanda tenha sido ajuizada anteriormente às alterações promovidas pela Lei nº 14.230/21.
O que representa um grande avanço jurisprudencial e corrige um desequilíbrio processual histórico, pois, nos processos em geral, há muito a indisponibilidade de bens depende da demonstração cumulativa da probabilidade do direito (fummus boni iuris) e do perigo da demora (periculum in mora), ao passo que nas ações de improbidade administrativa bastava o indício de responsabilidade do agente supostamente ímprobo para fundamentar o bloqueio dos seus bens. Não era necessário demonstrar, sequer, vestígio de dilapidação patrimonial do réu.
E essa situação era mantida durante todo o deslinde da ação, comumente demorada. Mesmo que a ação de improbidade fosse julgada improcedente, normalmente o desbloqueio só ocorria após o trânsito em julgado da improcedência.
Agora, além de possuir regras mais criteriosas para o seu deferimento, a liminar de bloqueio de bens pode ser revista a qualquer tempo e grau de jurisdição, contanto que ocorra comprovada modificação das circunstâncias ou fato superveniente que afete os fundamentos pelos quais a medida foi deferida.
Escrito por:
Mozart Iuri Meira Cótica
Advogado – Integrante do Setor de Direito Administrativo