Por Cristiane Aparecida Nogueira, advogada da área de Direito Imobiliário do Casillo Advogados.
A dúvida frequentemente levantada sobre a incidência ou não de multa rescisória nos casos em que a devolução do imóvel ocorre por ordem judicial – despejo – foi recentemente respondida pela Terceira Turma do STJ, no julgamento do Recurso Especial n° 1906869, que em 14 de junho de 2022 validou o seguinte entendimento: “A multa compensatória também é devida em caso de devolução do imóvel locado determinada em ordem judicial de despejo”.
Popularmente conhecida como Lei do Inquilinato, a Lei n° 8.245/1991 rege as locações imobiliárias e estabelece uma série de regras, deveres e direitos para essas relações, dentre os quais, podemos destacar a impossibilidade de o locador reaver o imóvel locado antes do prazo determinado, ao passo em que o locatário, em sentido diverso, poderá devolvê-lo antes do término do prazo, incidindo, nessa hipótese, a multa compensatória definida no contrato, proporcional ao período em que permaneceu utilizando o imóvel, conforme previsto no art. 4° da referida Lei.
Deparando-se o locador com algum descumprimento contratual por parte do locatário, seja pela falta de pagamento dos alugueres, seja por alguma infração contratual, deverá necessariamente ingressar com ação de despejo a fim de retomar o imóvel, a qual poderá, no primeiro exemplo (falta de pagamento), ser cumulada com cobrança, e se julgada procedente, o contrato será rescindido, respondendo o locatário (e fiador, se houver), por todos os débitos até a imissão na posse na posse do imóvel.
Nessa conjuntura, apesar de a devolução do imóvel ocorrer por culpa do locatário, muitos locadores não se sentiam juridicamente tutelados para exigir a multa compensatória, vez que ao utilizar a expressão “poderá”, a redação do art. 4° da Lei 8.245/1991 abria margem para ser interpretada como devida a multa apenas quando a devolução partisse da iniciativa do próprio locatário.
Valendo-se disso quando pretendiam devolver o imóvel antecipadamente, alguns locatários, especialmente na locação não residencial, para se eximirem da cobrança da multa contratual, deixavam de pagar os alugueres e encargos da locação, aguardavam o ajuizamento e julgamento da demanda, e ao final, após a decretação do despejo e rescisão do contrato, respondiam somente por esses débitos, sem a inclusão de qualquer multa compensatória, ocasionando ainda mais prejuízos financeiros ao locador.
Assim, ao enfrentar a controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça deu elementar passo para equilibrar a relação locatícia, reconhecendo que:
- “Em decorrência da quebra contratual, ainda que o bem locado não seja voluntariamente devolvido por iniciativa do próprio locatário, o credor (no caso, o locador) pode exigir o pagamento da multa compensatória, sem prejuízo dos efeitos da mora.”
- “Caso contrário, para fazer jus à execução da cláusula penal, o locador deveria apenas cobrar judicialmente os aluguéis em atraso, sem o pedido de despejo, e deixar que o locatário devolvesse o imóvel ao seu bel-prazer. Isso acarretaria o esvaziamento do instituto criado para recompensar os prejuízos em situação de descumprimento do negócio e penalizaria o locador que não poderia fazer o uso de medida legal de despejo, sob pena de perder a multa compensatória.”
- “(…) quando utiliza a construção “poderá devolvê-lo”, não se refere apenas à devolução por atitude espontânea do locatário, mas também às hipóteses nas quais a restituição do bem ocorre forçadamente por força de determinação judicial.”
Muito embora o julgado não possua efeito vinculante, estabelece importante direcional aos demais tribunais pátrios para o julgamento de demandas análogas e representa relevante conquista aos locadores, que terão maior segurança jurídica para cobrar o débito decorrente da multa pela devolução antecipada do imóvel, ainda que esta tenha ocorrido em função de despejo compulsório.