A sub-rogação no Direito Brasileiro permite que terceiro, alheio à relação jurídica pré-
existente, cumpra com a dívida, tornando-se ele credor do devedor originário. Assim, a
dívida deixa de ser cobrada por quem possuía o direito, e sub-roga-se ao novo credor.
Importante destacar que a dívida originária não se extingue, mas tão somente alteram-
se os sujeitos da relação, em especial, o credor, podendo ser proposta judicialmente,
ação regressiva para a cobrança da obrigação.
Tal instrumento é regrado, em suma, pelo Código Civil nos artigos. 346 a 351 e 786,
tratando das hipóteses e limites da sub-rogação. Quanto aos limites, necessário se faz
a análise do disposto no art. 349: “A sub-rogação transfere ao novo credor todos os
direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o
devedor principal e os fiadores.”
Veja-se que o dispositivo legal traz ampla abrangência aos direitos do sub-rogado,
entretanto deixando lacuna quanto à natureza destes direitos. Neste aspecto, há muito
se discute nos tribunais se tais direitos sub-rogados estendem-se aos direitos
processuais, visto que não há tais disposições no Código de Processo Civil ou nas
leis especiais. Há, portanto, interpretação de que o legislador, ao não abarcar a sub-
rogação no código processual, o fez propositadamente, a fim de que tais efeitos
restrinjam-se às questões materiais.
A discussão tornou-se relevante nos casos em que o credor originário se configurava
como Consumidor, e, portanto, atraindo para as demandas as regras do Código de
Defesa do Consumidor, o CDC.
Por tratar-se de Lei Especial, imbuída de status Constitucional, o CDC atribui às
demandas consumerista alterações tanto no Código Civil, quanto nas regras
processuais, buscando a proteção do sujeito vulnerável e hipossuficiente.
A controvérsia está exatamente no ponto em que o sub-rogado não se enquadra como
consumidor, como nos casos das seguradoras, mas tão somente o credor originário.
Todavia, este busca a aplicação para si, além dos direitos materiais, dos privilégios
processuais do CDC, propondo ações regressivas contra o devedor originário no local
da sua sede.
O fundamento está no art. 101, I do CDC, que privilegia a facilitação do acesso ao
judiciário pelo consumidor, e afasta o disposto nos artigos 46 e 53, III “a”, IV, “a” do
Código de Processo Civil, que preveem o domicílio do réu, a sede da empresa
(quando pessoa jurídica) ou o lugar do ato ou fato para a propositura da ação.
A discussão quanto a competência territorial nas ações regressivas por sub-rogação
propostas por seguradoras, em virtude dos sinistros indenizados aos segurados,
chegou massivamente ao Superior Tribunal de Justiça, havendo dissonância inclusive
entre as Turmas.
Assim, buscando a uniformização de entendimento, fora instaurado Incidente de
Uniformização de Demandas Repetitivas junto à Corte Especial do STJ, tendo sido, no
último dia 16 de setembro, proferida decisão de admissibilidade e afetação dos Recursos Especiais e Agravos em Recurso Especial que versem sobre a matéria, com suspensão de todos os processos.
Tem-se que, em critérios práticos, a decisão exarada pela Corte Especial, impacta,
sobremaneira, as demandas propostas pelas seguradoras, em face de sua sub-
rogação. Isto porque, as seguradoras, atuando como sub-rogadas dos direitos de seus
segurados, buscam a recuperação dos valores gastos com o pagamento de sinistros
em favor desses segurados, em alguns casos, no foro da sua sede.
Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça, atento às movimentações apresentadas
perante ao Judiciário, considerando que as seguradoras têm procurado “escolher” uma
jurisdição mais favorável a elas, movendo ações de ressarcimento em tribunal distante
dos fatos e desconectado da realidade local, ou até mesmo da sede dos fornecedores,
tem-se que, perante os autos do REsp nº 2092311 / SP (2023/0296733-6), restou
recentemente determinada a afetação dos Recursos Especiais 2.092.311/SP,
2.092.308/SP, 2.092.313/SP e 2.092.310/SP, para consolidar o entendimento acerca
da seguinte questão jurídica: “Definir se a seguradora sub-roga-se nas prerrogativas
processuais inerentes aos consumidores, em especial na regra de competência
prevista no art. 101, I, do CDC, em razão do pagamento de indenização ao segurado
em virtude do sinistro.”.
Desta forma, nos termos do art. 1.037, II, do Código de Processo Civil, restou
determinada a suspensão do processamento de todos os recursos especiais e dos
agravos em recurso especial, em trâmite nos Tribunais de segundo grau ou no STJ,
que versem sobre idêntica questão.
As demandas acima destacas, e ora afetadas, são baseadas em danos elétricos
sofridos por equipamentos eletrônicos dos segurados, supostamente devido a falhas
no fornecimento de energia elétrica.
Desta forma, conclui-se que a decisão proferida pela Corte Especial, demonstra um
marco importante para consolidação do entendimento não apenas relacionadas às
ações propostas decorrentes de suposta falha no fornecimento de energia, mas
também, à aplicabilidade da regra de competência às seguradoras em um sentido
geral.
Escrito por:
Natália da Cruz Cambui
Advogada – Integrante do Setor de Direito Securitário
Advogada Anna Carolina Casagrande
Advogada – Integrante do Setor de Direito Securitário