Por Cristian Luiz Moraes
Nascido a partir da concepção garantista que abrangeria a imensa maioria das relações jurídicas desenvolvidas a partir da Constituição Federal de 1988 e de uma série de diplomas normativos subsequentes que tutelariam relações envolvendo interesses específicos das mais diversas ordens, consolidou-se gradualmente um entendimento patente, perante as Cortes de Justiça, de que os pactos empresariais firmados poderiam, de toda a sorte, serem controlados judicialmente.
Estigmatizou-se, a partir de então e por muito tempo, a ideia de que alguns setores empresariais ostentariam verdadeiro poder opressor sobre seu parceiro negocial, afastando-se, assim, o caráter bilateral da relação contratual em detrimento de aspectos abstratos e intangíveis de proteção àquele que aparenta estar relegado à condição de maior fragilidade técnica ou financeira.
Nesse cenário – perceptível, mas não reconhecido – foi editada a Lei nº 13.874/2019 (Lei da Liberdade Econômica), que, em seu art. 3°, inc. VIII, determinou que são direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, “ter a garantia de que os negócios jurídicos empresariais paritários serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de direito empresarial apenas de maneira subsidiária ao avençado, exceto normas de ordem pública”.
A lei arejou os contratos empresariais, que, contudo, somente passaram a auferir eventual executoriedade à liberdade de estipulação a partir do firme e contínuo reforço do STJ à ideia de contenção no controle judicial de cláusulas contidas em ditos instrumentos pactuais.
Atualmente, são diversos os posicionamentos do STJ que atestam de forma veemente que o controle judicial sobre eventuais cláusulas abusivas em contratos empresariais é mais restrito do que em outros setores do direito privado, valendo-se da noção de que os agentes lá inseridos estão habituados às regras costumeiramente seguidas pelos integrantes do setor explorado e envolvido.
Foi nessa linha de entendimento que, no julgamento do Recurso Especial nº 1.910.582-PR, a Terceira Turma do STJ, em julgamento havido em 17.08.2021, acatou a tese defendida pela equipe jurídica do CASILLO ADVOGADOS, para reconhecer como “válida e eficaz a cláusula contratual (…) que transfere custos do locador ao locatário, impondo a este o dever de arcar com os honorários contratuais previamente estipulados”.
No corpo do v. aresto, assinalou-se que “Nos contratos empresariais deve ser conferido especial prestígio aos princípios da liberdade contratual e do pacta sunt servanda, reconhecendo-se neles verdadeira presunção de simetria e paridade entre os contraentes, sendo imprescindível observar e respeitar a alocação de riscos definida pelas partes”.
Apesar de sutil, a crescente aplicabilidade mais rígida do STJ em ditos debates é imprescindível para a construção de um modelo jurisdicional que, de fato, tutele as liberdades econômicas.
A preocupação crescente do STJ, desse modo, em conter a interferência jurisdicional de contratos empresariais a partir da mera alegação de violação a princípios civilistas de boa-fé objetiva ou função social instrumental vem em boa hora.
Não obstante a inegável relevância de ditos princípios, a mensuração de eventuais violações a seus traços, hoje, exige a ponderação conjunta e concomitante à existência de equilíbrio e liberdade entre as partes durante a contratação, bem como da natureza do contrato e as expectativas dos contraentes quanto a tal.
Somente dessa forma moderada e racional é que conteremos eventuais distorções principiológicas que, sem uma análise conjunta e ponderada entre os diversos perfis que envolvem a pactuação num cenário empresarial, não desviem o princípio de incremento à atividade econômica que se busca em nosso Estado Democrático de Direito.