PL nº 3999/2020 e a proposta de criação do procedimento de despejo extrajudicial

Por Gustavo Henrique Ellerbrock

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 3999/2020 – de proposição do Dep. Hugo Leal e recentemente aprovado pela Comissão de Defesa do Consumidor, nos termos do substitutivo proposto pelo relator Dep. Celso Russomanno –, que visa instituir os procedimentos de despejo extrajudicial, no caso de falta de pagamento do aluguel e encargos acessórios, e de consignação extrajudicial de chaves.

Em resumo, o PL pretende tornar mais dinâmico o mercado de locações imobiliárias, ao permitir que tanto o locador como o locatário possam colocar fim à locação, a princípio, sem necessidade de intervenção do Poder Judiciário.

Na hipótese do despejo, o locador poderá requerer ao Oficial do Cartório de Registro de Títulos e Documentos que proceda à notificação do inquilino, para que desocupe o imóvel voluntariamente ou realize o pagamento da dívida no prazo de 30 (trinta) dias.

Desocupado o imóvel, o locador poderá imitir-se na posse imediatamente, sem prejuízo da possibilidade de cobrança do saldo devedor pelas vias adequadas. Se, por outro lado, o locatário não desocupar o espaço e tampouco pagar a dívida, o locador poderá ingressar com ação judicial para requerer ao juiz competente que determine o despejo compulsório.

Nesse caso, se o locador apresentar ata notarial lavrada pelo Tabelião de Notas da comarca do imóvel, comprovando que o mesmo segue sendo ocupado pelo locatário, o juiz determinará sua citação juntamente com a expedição da ordem de despejo compulsório, que deverá ser cumprida por oficial de justiça imediatamente após o esgotamento do prazo para contestação. 

O substitutivo também estabelece que os bens do locatário localizados no imóvel deverão ser retirados no prazo máximo de 30 dias, mediante pagamento do custo de armazenamento, sob pena de serem considerados abandonados.

Por fim, ao propor alteração na Lei nº 6.015/1973, o PL também se dedica a coibir a ocultação de má-fé por parte dos locatários, prevendo a possibilidade de notificação pessoal, por via postal, por meio eletrônico e por edital, admitindo-se, ainda, a opção de notificação por hora certa. O substitutivo também propõe que a notificação extrajudicial feita em condomínio edilício, loteamento e demais locais com controle de acesso poderá ser efetivada por meio da entrega a funcionário da portaria ou ao responsável pelo recebimento de correspondências, no compasso do que já se admite nas hipóteses de citações e intimações judiciais.

Infelizmente é necessário sublinhar que, na forma como proposto, o novo procedimento somente será efetivo se o locatário concordar em desocupar o imóvel de boa vontade. Caso isso não ocorra, o locador continuará se vendo forçado a recorrer à jurisdição para reaver o imóvel locado, questão que, na prática, acaba apenas por adicionar uma fase extrajudicial “preliminar” à ação de despejo, postergando ainda mais a retomada do bem.

Além disso, relevante ressaltar que a proposição não aborda a questão atinente às garantias contratuais, e não deixa claro como proceder ou mesmo se o despejo extrajudicial será admitido na hipótese em que o contrato seja garantido por fiança pessoal, por exemplo. Em seu silêncio, aparenta também encerrar uma contradição entre o § 5º do novo art. 66-D – que propõe que o despejo compulsório ocorra imediatamente após o esgotamento do prazo para contestação –, e o atual art. 59, § 1º, IX, da Lei de Locações – que já previa a possibilidade de concessão de ordem liminar de despejo em razão da falta de pagamento, porém, somente se o contrato fosse desprovido de qualquer modalidade de garantia.

Por outro lado, como ponto positivo, ressaltamos que, ao transferir mais essa função para os cartórios do foro extrajudicial, a proposta almeja sanar o problema dos locadores – que muitas vezes se veem presos a locatários inadimplentes por longo período, em razão da morosidade inerente ao processo judicial – e contribuir para a desobstrução do próprio Poder Judiciário, por meio da redução do acervo processual. Trata-se de uma tendência crescente em solo brasileiro, na mesma linha do que já ocorreu com as legislações que instituíram o divórcio extrajudicial, o inventário e a partilha extrajudiciais, a alienação fiduciária e a usucapião extrajudicial.

Embora o PL ainda careça de lapidação mais criteriosa, a iniciativa é louvável, sem dúvida, haja vista que, além de proporcionar maior segurança jurídica aos locadores ao facultar a utilização de uma via – em tese – mais eficaz, a retomada célere do imóvel também possibilitará sua rápida entrega em nova locação, firmando-se novos contratos que circularão renda e fortalecerão ainda mais o mercado locatício.

Deixe uma resposta